segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Prestíssimo


O texto abaixo foi publicado na revista Sabiá, edição número 64, de novembro de 2013, sob o título de “Uma abordagem criativa.” Por falta de espaço, o primeiro parágrafo ficou de fora. Então o incluo abaixo.

A lei federal 11.769 obriga todas as escolas do país a oferecer cursos de música. Esta é uma lei nova, de 2008. Não é a imposição legal que faz da Escola Suíça uma das que mais investe no aprendizado desta disciplina no Brasil. Nossa escola antecipou – se em décadas à percepção dos políticos. A “ficha” da educação musical caiu há muitos anos por lá e cai agora finalmente por aqui: estudar a arte dos sons traz múltiplos benefícios à criança em idade escolar. Porque é assim? O que a música, essa miscelânea (às vezes confusa) de sons tem para oferecer afinal? Para rastrear tais razões precisaremos ir além da superfície dos fatos.


Anne Bamford, diretora do Engine Room project da University of the Arts of London tem dedicado sua carreira a examinar o impacto das artes na sociedade e à função da criatividade na educação. Ela explica que a neuroplasticidade do cérebro de toda criança tem capacidade ilimitada de formar novas conexões e redes. Isso significa que, ainda pequenos, todos nós temos um ilimitado potencial para pensar lateralmente.


O tipo de experiência a que a criança será exposta, principalmente na escola, é que ampliará ou reduzirá tal potencial. Isto, segundo a pesquisadora, não tem muita relação com o pensar acadêmico.

Se a criança não encontra um contexto para expressar sua necessidade artística ou criativa, ilustra Bamford, ela vai achar formas distorcidas de fazê -lo, através de comportamentos inadequados e de indisciplina.
O ensino de música com uma abordagem criativa aumenta a felicidade, torna o aprendizado divertido, ensina as crianças a lidarem com o inesperado. A ênfase no universo sonoro e estético convida à percepção mais apurada de si mesmo e por consequência do outro. São introduzidos parâmetros para avaliar o Belo. Pensar sobre a percepção integra hemisférios esquerdo e direito do cérebro, desvela o mundo subjetivo, a realidade interior, a inteligência emocional.


Tocar em grupo requer silêncio, disciplina e concentração. Não se faz nada com qualidade sem esses quesitos. Chamamos atenção para o prazer de se escutar o silêncio. Silêncio. A tela branca sobre a qual os acordes serão pincelados. Parece fácil ao dizer mas sabemos que não não o é. O silêncio, a disciplina e a concentração são ideais buscados em cada próximo minuto de convivência.


Mas há o outro lado. A liberdade de ousar, de pular no caldeirão criativo; viver a experiência do entusiasmo. É preciso aprender a lidar com uma pitada de caos, onde as novas ideias são geradas. O caldo criativo necessita liberdade de expressão e enorme tolerância ao erro. Quem não sabe errar não sabe criar (também conhecido como quem não arrisca não petisca).


Traçando um rápido perfil do ensino musical na escola, o ponto de partida foi, como era de se esperar, a integração das abordagens pedagógicas suíça e brasileira. Oferecemos a vivência e o ambiente de aprendizado, em contraponto ao trabalho acadêmico das demais disciplinas. Damos ênfase à socialização e à valoração das diferenças, dos talentos individuais. Nosso jeito de trabalhar, de organizar o mobiliário e de avaliar é um pouco diferente. Somos atentos à comunicação não verbal, aos altos e baixos. Trabalhamos com um aparelho chamado “autoestimômetro”. Buscamos de um lado a inclusão do aluno com dificuldade de aprendizado e de outro a excelência do resultado sonoro. Seguimos o caminho, equilibrando-nos sobre esta linha de aparente paradoxo.


Os alunos iniciam a jornada pequeninos no ensino fundamental, com noções de musicalização e com os primeiros contatos com um instrumento: a flauta. A experiência com o instrumento se expande no fundamental dois, com quatro novos cursos. Bateria, teclado, violão e flauta transversal. A teoria é trabalhada em uma aula específica. As crianças aprendem a enxergar a música como uma língua que expressa sentimentos. Crescem mais integrados; mais cientes de si mesmo (e portanto, mais cientes do outro). Com o ensino médio vem o amadurecimento da vida musical, uma maior especialização e busca por excelência. Colhem - se os frutos plantados ao longo dos anos.

Há muito pouco tempo atividades como Música e Trabalho Acadêmico eram vistos como mutuamente excludentes. Hoje temos farta evidência da correlação entre o pensamento criativo e o desempenho excelente em línguas, matemática e ciências. Precisamos aprender a ver a música não mais como lazer ou passatempo, mas como recurso econômico; atividade que multiplica inteligências, e agrega valor. O mundo hoje é parecido com a sonata número um em Fá menor de Beethoven. Deve ser tocado em tempo prestissimo. E quem não aprender a tocá -lo vai ficar para trás.


Bibliografia.

IB World magazine: Article - Creativity: It’s not what you know...


http://www.ibo.org/ibworld/may2011/leadfeaturecreativity.cfm

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